Guerra civil, que já dura 13 anos, voltou à tona após rebeldes que lutam contra regime de Bashar al-Assad tomarem Aleppo e fecharem o cerco a Homs, duas das maiores cidades do país. Guerra começou como parte da Primavera Árabe contra ditadores e já deixou mais de 500 mil mortos. Rebeldes dirigem na direção da cidade de Homs, na Síria.
Aref TAMMAWI / AFP
Neste sábado (7), os rebeldes jihadistas da Organização para a Libertação do Levante (HTS, na sigla local) avançaram em direção à capital, adentrando a cidade de Homs, um bastião do governo sírio por fazer ligação entre a capital Damasco e a costa mediterrânea.
No mesmo dia, os dissidentes também tomaram o controle de Sanamayn, a cerca de 20 km do portão sul de Damasco, e a província sulista de Suweida, próximo à fronteira com a Jordânia, onde a facção drusa tomou a maioria das bases do exército, que se retirou do território.
Na quinta (5), os rebeldes também tomaram o controle da cidade estratégica de Hama.
Cerco a Damasco: veja a cronologia do avanço rebelde na Síria
O ataque começou com a tomada de Aleppo, a segunda maior cidade do país e seu centro financeiro. A ofensiva foi uma das maiores em 13 anos de guerra na Síria entre forças rebeldes e o Exército, fiel ao ditador Bashar al-Assad, que controlava cerca de 70% do território sírio até a retomada dos combates.
⚠️O ditador sírio Bashar al-Assad, no poder há 24 anos, conta com o apoio de aliados influentes e poderosos na região, como Rússia, Irã e o grupo extremista Hezbollah. Apesar disso, o momento turbulento na política internacional não favorece a Síria. Irã e Hezbollah estão enfraquecidos pelo conflito com Israel e a Rússia trava guerra com a Ucrânia que já dura dois anos.
Além das ações da organização HTS, episódios de insurgência chegaram até a capital, onde manifestantes derrubaram uma estátua do pai de Bashar al-Assad, o ex-presidente Hafez al-Assad, no distrito de Jermana, nos subúrbios de Damasco.
Entenda, a seguir, como e por que ocorreu essa nova escalada na disputa, e quais os atores envolvidos.
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Rebeldes avançam sobre terceira maior cidade da Síria
Qual é o principal grupo insurgente contra Bashar al-Assad
Rebelde gesticula na cidade de Hama após a captura pelos dissidentes.
OMAR HAJ KADOUR / AFP
Insurgentes liderados pelo grupo jihadista Hayat Tahrir al-Sham (em português, Organização para a Libertação do Levante) lançaram o ataque a Aleppo na semana passada e se moveram para o interior ao redor de Idlib, da província vizinha de Hama e da província central de Homs. Os militares sírios apressaram reforços e lançaram ataques aéreos.
Os EUA e a ONU há muito tempo designaram a força que lidera o ataque em Aleppo — Hayat Tahrir al-Sham, conhecida por suas iniciais HTS — como uma organização terrorista.
Seu principal líder, Abu Mohammed al-Golani, surgiu como chefe do braço sírio da Al-Qaeda em 2011, nos primeiros meses da guerra da Síria. A entrada do grupo terrorista marcou um ponto de virada no conflito, que havia se iniciado com protestos pacíficos, reprimidos brutalmente pelo regime de Assad.
Golani e seu grupo logo no início assumiram a responsabilidade por atentados terroristas, prometeram atacar forças ocidentais, confiscaram propriedades de minorias religiosas e instituíram uma polícia religiosa para as áreas sob seu controle.
Nos últimos anos, o HTS buscou se reerguer, concentrando-se em promover um governo civil em seu território, bem como a ação militar, observou o pesquisador Aaron Zelin. O grupo rompeu laços com a Al-Qaeda em 2016.
Quem são os rebeldes que assumiram controle de Aleppo em meio a bombardeios russos
Golani reprimiu alguns grupos extremistas em seu território e cada vez mais tenta se mostrar como um protetor de outras religiões. Isso inclui, no ano passado, permitir a primeira missa cristã na cidade de Idlib em anos.
Em 2018, o governo Trump reconheceu que não estava mais mirando diretamente em Golani, disse Zelin. Mas o HTS permitiu que alguns grupos armados procurados continuassem a operar em seu território e atirou em forças especiais dos EUA pelo menos até 2022, disse ele.
Quem são os outros atores na guerra civil síria
Presidente da Síria Bashar al-Assad, que governa o país desde a morte de seu pai, em 2000.
JOSEPH EID / AFP
Bashar al-Assad: Ditador sírio desde 2000, quando sucedeu seu pai, Hafez a-Assad, após a morte deste. Sua família é alauíta, grupo muçulmano xiita. Ele governa de forma laica com o apoio da ditadura teocrática do Irã e é aliado do grupo extremista libanês Hezbollah, também xiitas. Seu principal aliado internacional é a Rússia, cuja Força Aérea realizou diversos ataques a posições rebeldes durante o auge da guerra civil, até 2015.
Hezbollah: partido libanês xiita, aliado do Irã que luta principalmente contra Israel. Na guerra civil síria, porém, o grupo extremista engajou seu braço militar nos combates ao lado do regime de Assad. Agora, novamente, um destacamento foi para Homs lutar contra os rebeldes do HTS.
Estado Islâmico: O grupo terrorista declarou em 2014 um califado que tomou partes da Síria e do Iraque. O ramo da Síria e do Iraque do Estado Islâmico não controla mais nenhum território e não é conhecido por desempenhar um papel na luta atual. Mas ainda é uma força letal operando por meio de células adormecidas nos dois países.
EUA e Israel: Tanto os EUA quanto Israel conduzem ataques ocasionais na Síria contra forças do governo e milícias aliadas ao Irã. Os EUA têm cerca de 900 militares no nordeste da Síria, longe de Aleppo, para se proteger contra um ressurgimento do Estado Islâmico.
Turquia: A Turquia também tem forças na Síria e tem influência com a ampla aliança de forças de oposição que invadem Aleppo.
Curdos: Uma força militar curda conhecida como Forças Democráticas Sírias (FDS) controla territórios no nordeste do país, na fronteira com a Turquia e o Iraque. Embora aliadas aos EUA, eles têm laços com o grupo do Curdistão turco PKK, considerado uma organização terrorista pelo Ocidente. Recentemente, eles reivindicaram a tomada da cidade de Deir al-Zor, no leste, às margens do rio Eufrates.
Controle do território da Síria em 6 de dezembro de 2024
Editoria de Arte/g1
Por que o conflito recomeçou
Estátua de Hafez al-Assad é derrubada por manifestantes anti-governo
Para o diplomata Robert Ford, que foi último embaixador dos EUA na Síria antes de os dois países cortarem relações, três fatores deram aos rebeldes a possibilidade de avançar no conflito sírio:
Os ataques que Israel vêm fazendo há meses contra alvos do Hezbollah na Síria — o grupo extremista, apesar de ser do Líbano, também atua em conflitos do Oriente Médio ao lado de aliados, como, neste caso, Bashar al-Asad;
O cessar-fogo firmado por Israel e o Hezbollah no Líbano na semana passada;
A Rússia, principal apoiadora internacional de Assad, também está preocupada com sua guerra na Ucrânia.
Por que a tomada de Aleppo é tão importante
Dissidentes do Exército de Assad se entregam para as forças rebeldes em Aleppo.
AAREF WATAD / AFP
Na encruzilhada de rotas comerciais e impérios por milhares de anos, Aleppo é um dos centros de comércio e cultura do Oriente Médio.
A cidade era o lar de 2,3 milhões de pessoas antes da guerra. Rebeldes tomaram em 2012 o lado leste de Aleppo, que se tornou um símbolo do avanço das facções armadas da oposição.
Em 2016, forças governamentais apoiadas por ataques aéreos russos sitiaram a cidade. Projéteis russos, mísseis e bombas de barril cruas — latas de combustível ou outros contêineres carregados com explosivos e metal — arrasaram diversos bairros.
Famintos e sitiados, os rebeldes renderam Aleppo naquele ano.
A entrada dos militares russos foi o ponto de virada na guerra, permitindo que Assad permanecesse no território que ele controlava.
Neste ano, ataques aéreos israelenses em Aleppo atingiram depósitos de armas do Hezbollah e forças sírias, entre outros alvos, de acordo com um grupo de monitoramento independente. Israel raramente reconhece ataques em Aleppo e outras áreas controladas pelo governo na Síria.
Publicada por: RBSYS